quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Honorários de sucumbência: O que são (e mais importante) de quem são?



Bom, honorários (com “s” no final) é o nome que se dá a remuneração recebida pelos profissionais liberais (sem vínculo empregatício), como médico, advogado, despachante, eletricista, mecânico, arquiteto etc.

Esses honorários, podem ser de duas espécies os contratuais e os chamados “honorários de sucumbência” que são aqueles devidos pela parte que “sucumbiu”, isto é, que foi vencida em uma demanda judicial.

Já sabendo o que são, a grande questão em voga é de QUEM são os honorários.

Pois bem para responder isso temos de partir da premissa de que no direito brasileiro nem sempre o que é, de fato, é. Como assim? Sim, no direito brasileiro muitas vezes a lógica da ciência jurídica é derrubada com um simples dispositivo legal, de modo que o que deveria ser, não é. Qual o motivo? A própria lei.

Pela lógica os honorários de sucumbência pertencem à parte vencedora, são parte da reparação integral do dano (Código Civil, art. 944) na medida em que, em tese, ao necessitar da intervenção do advogado para a via judicial (CPC, art. 36), por óbvio, haverá de remunerar esse profissional que a representará, por meio dos chamados “honorários contratuais” livremente pactuados, respeitados os limites éticos da profissão de advogado (Código de Ética da Advocacia, art. 35).

Então ao remunerar o seu advogado a parte, por óbvio, não receberá os valores integrais. Exemplifico com números: Se a parte pretende cobrar em juízo R$ 1.000,00, pagará ao seu advogado , por exemplo, 20%, então, quando receber, receberá somente R$ 800,00.

Mas a restituição não deve ser integral? Exatamente, e por isso o Código de Processo Civil, impôs que “a sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios” (Art. 20), veja-se o código fala que o “vencido” pagará ao “vencedor”, não ao procurador do vencedor honorários, esses sim, os chamados honorários de sucumbência.

E qual o motivo que a lei mandou o “vencido” pagar ao “vencedor”? Para que este seja ressarcido integralmente, pois já pagou (ou pagará se o contrato for de risco) honorários contratuais. Novamente a matemática explica:
Valor cobrado: R$ 1.000,00
Honorários Contratuais: R$ 200,00 (20%)
Valor Recebido: R$ 800,00
Honorários de sucumbência: R$ 200,00 (20%)
Valor final Ressarcido: R$ 1.000,00 (integral)

Viram? Uma lógica incontestável, pois com a aplicação do art. 20 do CPC a parte tem a sua reparação integral e o advogado recebe os seus honorários contratuais.

Mas quem disse que a lógica serve para o direito?

Não, a lógica pode ser subvertida com poucas palavras. Em 1994, sobreveio a lei 8.904/94, e em seu art. 23 disse “Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado”, e então a lógica mudou, pois agora os honorários não mais pertencem ao vencedor, e sim ao seu procurador, e a matemática passou a ser outra

Valor cobrado: R$ 1.000,00
Honorários Contratuais: R$ 200,00 (20%)
Valor Recebido: R$ 800,00
Honorários de sucumbência: R$ 200,00 (20%)
Valor final Ressarcido: R$ 800,00 (parcial 80% do principal)
Valor recebido de honorários: R$ 400,00 (40% do principal, 50% da proporção recebida pela parte)

E um detalhe, fiz as contas sempre observando honorários contratuais de 20%, mas o STJ entendeu que não são abusivos honorários arbitrados em até 30% , com o que, respeitada eventual abusividade no caso concreto, pode ser razoável especialmente se excessivamente complexa a demanda. Se adotados honorários contratuais de 30% assim seria a conta:

Valor cobrado: R$ 1.000,00
Honorários Contratuais: R$ 300,00 (30%)
Valor Recebido: R$ 700,00
Honorários de sucumbência: R$ 200,00 (20%)
Valor final Ressarcido: R$ 700,00 (parcial 70% do principal)
Valor recebido de honorários: R$ 500,00 (50% do principal, 71% da proporção recebida pela parte)

E mais, há um precedente no TJPR (APELAÇÃO CÍVEL Nº 988.646-0, de Cornélio Procópio – Vara Cível E Anexos, j. em 06/06/2013, Rel. Desa. ROSANA AMARA GIRARDI FACHIN) que reconheceu a validade de honorários contratuais fixados em 50% sobre o valor da condenação, em tal caso vejamos como ficaria a conta:

Valor cobrado: R$ 1.000,00
Honorários Contratuais: R$ 500,00 (50%)
Valor Recebido pela parte : R$ 500,00
Honorários de sucumbência: R$ 200,00 (20%)
Valor final Ressarcido: R$ 500,00 (parcial 50% do principal)

Valor recebido de honorários: R$ 700,00 (70% do principal, 140% da proporção recebida pela parte)

Em todos os cenários, com os honorários de sucumbência migrando da parte para seu procurador, esse, literalmente, deixa de ser representante para ser sócio, igualitário do primeiro caso e largamente majoritários nos dois últimos exemplos.

A lei é inconstitucional? Não, não é, aliás o STF no julgamento do RE 564.132, ainda que obiter dictum, reconheceu a sua constitucionalidade ao permitir o fracionamento dos valores, sendo os honorários de sucumbência (se inferiores à 60SM) serem pagos por RPV e o principal por precatório ( se superior à 60SM), então efetivamente, por força de lei, os honorários são de titularidade do advogado, eu como magistrado tenho de dever de aplicar a lei, salvo se inconstitucional (o que não é o caso), por isso seguirei condenando o vencedor a ser ressarcido somente em parte.

Mas senhores, como eu disse na postagem anterior, não menosprezem o direito, ele é mais que a lei, a lógica jurídica é indiscutível que os honorários pertencem à parte por direito, mas a lei diz outra coisa, mas como disse Manuel Antônio de Almeida na obra “Memórias de um Sargento de Milícias”: “Ora a lei... o que é a lei, se o Sr. major quiser?

E por fim, antes de ser atacado com a velha frase “por isso que digo que juiz tem de advogar 5 anos, juiz não entende a vida de advogado, juiz tem salário fixo, férias, não paga secretária”, já informo que advoguei sim, por 5 anos, sustentei a minha família com a advocacia, mas isso não muda a natureza das coisas.

Mas fiquem tranquilos, eu aplicarei a lei, ela não é inconstitucional, só ilógica. Só acho que todos tem o direito de saber isso.

Rogerio de Vidal Cunha
Juiz de Direito da 1ª Vara Cível de Bandeirantes/PR
Professor Universitário


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