O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), deferiu Habeas Corpus (HC 92355) em favor do cabo da Marinha do Brasil, J.H.G, suspendendo, cautelarmente, o acórdão proferido pelo Superior Tribunal Militar (STM).
Estudante de Odontologia, o cabo alega em seu pedido de Habeas Corpus que era vítima de medidas que o impediam de freqüentar as aulas. Informa também que pediu o desligamento das Forças Armadas e que, decorridos seis meses de seu pedido de baixa, este ainda não havia sido concedido.
De acordo com o habeas, J.H.G. foi preso administrativamente e, na carceragem, em crise de depressão, o cabo tentou suicídio. Em liberdade, não compareceu ao serviço no dia determinado e foi denunciado por deserção (artigo 187 do Código Penal Militar) ainda no "prazo de graça" (período concedido pela lei que concede ao infrator oito dias de prazo para que ele possa evitar a consumação do crime de deserção).
Ao ser preso preventivamente, sua defesa ingressou com pedido de Habeas Corpus no STM. O ministro Flávio Bierrenbach, tornou nulo o termo de deserção, "por haver sido lavrado quando ainda corria prazo de graça", e ressalvou a possibilidade de ser feito novo termo de deserção, caso o militar permanecesse ausente.
Mesmo tendo se apresentado no mesmo dia em que foi comunicado do resultado da liminar, o militar se apresentou ao comandante. Entretanto, o HC acabou sendo indeferido no julgamento do mérito.
No pedido de liminar em HC impetrado no STF, a defesa solicita a expedição de salvo conduto para que o militar "permaneça em liberdade, não podendo ser preso pelo crime de deserção, reconhecendo a nulidade do termo de deserção e determinando o arquivamento do feito."
Decisão
O relator do HC, ministro Celso de Mello, citou parte do acórdão do STM, no qual o ministro Flávio Bierrenbach, afirma que "a lavratura equivocada do termo de deserção torna-o nulo e incapaz de produzir os efeitos legais." Assim, Celso de Mello deferiu o pedido de liminar
COMENTÁRIO:
Para os não acostumados com o Direito Penal e Processual Penal Militar é de se destacar que no caso citado não se trata de mera irregularidade no Termo de Deserção( como por exemplo, o equívoco na data de consumação, ou na contagem dos dias de graça) mas sim de nulidade, pois o mesmo foi lavrado antes de transcorrido o prazo de 08 dias que a Lei Penal Militar concede( período de graça), portanto, lavrou-se o Termo antes da consumação.
Mas a questão mais interessante e que ainda não foi enfrentada à altura pelo STF é a prisão preventiva "automática" do desertor, referendada pelo STM a vários anos( o que em nenhum momento significa correção no posicionamento) e ratificada , sem maiores fundamentações pelo STF.
Segundo o entendimento majoritário o desertor tão logo capturado submete-se a prisão pelo prazo de 60 dias, só podendo ser libertado antes de tal prazo acaso absolvido, pois bem, para nós tal prisão mostra-se ilegal pois para nós toda a prisão antes de sentença penal condenatória há de fundar-se em um risco cautelar, ou seja, para a decretação da prisão do desertor não basta o fato de ser o crime propriamente militar.
A interpretação que se faz do art. 5º , LVI da CF, para permitir a manutenção da prisão, sem ordem escrita e fundamentada, é totalmente desalinhada com os ditames da própria constituição.
Quando o art. 5º, LXI reza que "ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei", diz que os crimes propriamente militares estão equiparados à um "perpétuo flagrante" pois são crimes que , sempre, ofendem a hierarquia e a disciplina militares, ou seja, o que a constituição, para nós, permite é a imediata captura do criminoso militar, independente de ordem judicial anterior, ou da existência de uma das situações de flagrante do processo penal militar.
Mas, tão logo capturado o criminoso militar, no caso o desertor, deve-se dar cumprimento ao art. 5º, LXVII, com a comunicação ao Juizo competente( Justiça Militar) justamente para que possa o Juiz apreciar a necessidade da prisão, e, ausente esta, proceder o seu relaxamento( CF, art. 5º, LXV).
Aliás o outro argumento dos doutrinadores ditos majoritários seria a vedação à concessão da liberdade provisória ( CPPM art. 270, "b"), os quais entendem ter sido recepcionado pela CF/88 à vista do art. 5º LXVI( ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança), contudo, ainda que admita-se a vedação a liberdade provisória, a lei que o faz deve guardar proprocionalidade e jamais representar antecipação de juízo de culpabilidade.
E partindo-se da premissa estabelecida pelo STF no Julgamento da ADI 3112/DF ( Informativo STF 465) em que considerou-se inconstitucional a vedação da liberdade provisória nos crimes referentes ao Estatuto do Desaramento, tendo em vista que "considerou-se desarrazoada a vedação, ao fundamento de que tais delitos não poderiam ser equiparados a terrorismo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes ou crimes hediondos".
Relembremos ainda que a lei 11.464/07 não mais veda a liberdade provisória aos crimes hediondos, não havendo fundamento dogmático suficiente para admitir a concessão da liberdade provisória aos mais graves crimes previstos no ordenamento penal pátrio( tanto que merecedores de especial atenção do legislador constitucional) e não aos crimes previstos no art. 270, "b" do CPPM.
Como disse o Relator da ADI 3112/DF, Min Levendorski ao afirmar que "não obstante a interdição à liberdade provisória tenha sido estabelecida para crimes de suma gravidade, liberando-se a franquia para os demais delitos, a Constituição não permite a prisão ex lege, sem motivação, a qual viola, ainda, os princípios da ampla defesa e do contraditório (CF, art. 5º, LV)."
Esperamos que o STF mantenha a sua coerência a passe , a partir de agora, a deferir os pleitos de liberdade provisória aos desertores, quando ausentes os requisitos do art. 255 do CPPM.
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