O Informativo 477 do STF (aqui) traz a seguinte nota de julgamento:
Prisão Civil e Depositário Infiel
O Tribunal iniciou julgamento de habeas corpus, afetado ao Plenário pela 1ª Turma, em que se questiona a legitimidade da ordem de prisão, por 60 dias, decretada em desfavor do paciente que, intimado a entregar o bem do qual depositário, não adimplira a obrigação contratual. Sustenta-se, na espécie, a insubsistência da custódia, sob a alegação de que esta contrariaria a EC 45/2004, no que endossados tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos, haja vista que a subscrição, pelo Brasil, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de São José da Costa Rica impossibilitaria a prisão do depositário infiel - v. Informativo 471. O Min. Marco Aurélio, relator, deferiu o writ para afastar do cenário jurídico a ordem de prisão decretada contra o paciente. Entendeu que a circunstância de o Brasil haver subscrito o Pacto de São José da Costa Rica, que restringe a prisão civil por dívida ao descumprimento inescusável de prestação alimentícia, conduziria à inexistência de balizas visando à eficácia do que previsto no art. 5º, LXVII, da CF, dispositivo este não auto-aplicável, porquanto dependente de regulamentação, por texto legal, acerca dessa prisão, inclusive quanto ao seu período. Concluiu, assim, que, com a introdução do aludido Pacto no ordenamento jurídico nacional, restaram derrogadas as normas estritamente legais definidoras da custódia do depositário infiel. Ademais, ressaltou que, no caso, o paciente não tentara furtar-se ao pagamento de seu débito, formulando, até mesmo, propostas de acordo com a credora, todas rejeitadas. Após, pediu vista dos autos o Min. Celso de Mello.
HC 87585/TO, rel. Min. Marco Aurélio, 29.8.2007. (HC-87585)
Muito interessante a posição do STF pois reconhece aos Tratados Internacionais, não a força de Emenda Constitucional, mas sim de normas supra-legais, com poder de revogar todo o direito positivo infraconstitucional.
Ou seja, a Corte Suprema criou um artifício interessante ao outorgar efeito supra legal ao Pacto, pois a CF/88, prevê , ao contrário da Convenção , a prisão civil do depositário infiel, e afirmou que de fato há a previsão constitucional, contudo, tal regulamentação depende de legislação ordinária.
E , com base nesse entendimento , o STF entendeu que tem-se por revogadas as disposições LEGAIS que prevejam a prisão civil do depositário infiel, como por exemplo o Decreto-Lei 900/67( Alienação Fiduciária em Garantia).
Tal decisão é um grande passo em direção à aceitação pelo Brasil de um sistema supra-nacional de defesa dos direitos humanos, caminho que já havia trilhado a doutrina ( Flavia Piovesan, Marcelo Ribeiro Oliveira, Valério de Oliveira Mazzuoli, etc) , e que o STF jamais reconheceu permanecendo firme em seus dogmas à respeito da validade das normas internacionais somente como direito ordinário.
Tal tese restou, para nós, indevidamente "assassinada" com a EC/45, que, sem qualquer necessidade afirmou o que já existia, a natureza constitucional dos Tratados Internacionais relacionados com direitos humanos, mas estabeleceu o requisito formal de aprovação dos textos pelo Congresso Nacional com o mesmo quorum de Emendas Constitucionais, praticamente inviabilizando as medidas, pois todos sabemos da dificuldade do Congresso em votar qualquer coisa que não seja de interesse do Poder Executivo.
Mas agora cabe à doutrina estabelecer os limites dessa "supra-legalidade" e fazer uma releitura de vários institutos tidos como indiscutíveis, muito mais por falta de debatedores do que de debate.
Um comentário:
Realmente professor, o Snr. diz o ninguem fala... ou o que ninguem percebe! Vale a pena "perder" uns minutos aqui.
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