
Foi neste período que se aplicava um sistema de julgamentos chamado de inquisitivo ou inquisitorial. Foi no “Santo Ofício” que se observou sua aplicação de forma pura. Nele o “Juiz” da causa era o mesmo que acusava, produzia a provas e dava o veredito. A falência desse sistema restou comprovada há séculos, mas – talvez – não necessariamente abandonado.
Em 1988 entrou em vigor nossa Constituição Federal vigente. Ficou conhecida como “Constituição Cidadã”. Dentre tantas as razões de sua adjetivação temos o foco na dignidade da pessoa humana. Ao longo de seu texto são elencadas inúmeras bases de concretização dessa premissa constitucional elevada a fundamento da República Federativa do Brasil. Dentre elas a independência do Poder Judiciário, em grande medida, pelas garantias da Magistratura cujo trabalho cotidiano pressupõe, necessariamente, afrontar interesses diversos para restabelecer os direitos eventualmente violados e bem como preservar a ordem jurídica e institucional.
Nesta ótica podemos observar que a garantia da Magistratura pressupõe a garantia da própria ordem jurídica. Enfraquecer o Poder Judiciário minando a credibilidade de seus integrantes é uma violação ao próprio Estado de Direito.
Infelizmente a tônica do momento é o ataque indiscriminado aos Magistrados. Acusações vazias – ou não – são tratadas como juízos de condenações antecipadas. O pior é que muito desse procedimento tem sido levado a cabo por órgãos judiciais. Um “Santo Ofício” intestino.
A apologia pública a situações que fomentem a ruptura da ordem política ou social, como, por exemplo, os atos que contribuam para a iconoclastia do Poder Judiciário é hipótese criminal prevista na Lei de Segurança Nacional.
O significam as declarações públicas em rede nacional veiculando juízos de valor antecipados e depreciativos ao Poder Judiciário e seus membros?
A tentativa de mudança do Estado de Direito para qualquer outra forma de regime, mesmo que para um “Estado de Direito Seletivo”, pressupõe, se mediante o uso – ao menos – da grave ameaça, igual tipificação de crime previsto na Lei de Segurança Nacional.
Sem prejuízo da legislação penal extravagante mencionada, os atos públicos ou que induzem uma pecha ou denigrem a imagem dos membros do Poder Judiciário, principalmente em sede de julgamentos administrativos, podem atrair a responsabilidade de ilícitos previstos na Lei de Improbidade Administrativa. Para a responsabilização neste aspecto, basta, por exemplo, que haja um proceder desvinculado de um dos princípios basilares da administração pública como, v.g., a legalidade ou a impessoalidade. Fazer uma acusação pública não constante de autos específicos, distorcer o que neles existe, ou mesmo tentar prejudicar ou favorecer quem quer que seja no âmbito de uma função administrativa pública é mais que suficiente para a configuração de tal ilícito de improbidade.
Deixa-se de mencionar os óbvios tipos penais da prevaricação, violação de sigilo, falsidade ideológica, calúnia, injúria, difamação, constrangimento ilegal, ameaça, incitação ou apologia ao crime, supressão de documento, advocacia administrativa, usurpação de função pública, desacato, comunicação falsa de crime, coação no curso do processo, fraude processual,
exercício arbitrário ou abuso de poder, quebra de sigilo sem autorização judicial.
Enfim, a pretexto de exercer atividade disciplinar de natureza administrativa, tem se visto no Brasil um movimento de grave violação da ordem jurídica e institucional, onde, muitas vezes a título de exercício do legítimo “Poder Disciplinar Administrativo” está a se violar a legislação criminal, político-administrativa e de segurança nacional.
Observa-se, não raro, que:
1) A acusação pode ser o próprio delito;
2) A inquisição da “Idade das Trevas” pode acontecer hoje impunemente;
3) Podemos estar substituindo um Estado de Direito por um Estado Ideológico de jurisdição e sancionamento seletivos.
Se for impossível o resgate de um sistema de prevalência dos direitos individuais e da Lei, que, ao menos, o “pau que toca para Tomé, toque também para Mané.”.
O que falta para tomarmos as providências cabíveis? Termos nossas funções, vidas, atribuições e credibilidade esvaziadas? Aí... Aí poderá ser tarde demais.
O Texto Acima é de autoria do Colega Vitor Bizerra, que é Juiz de Direito no Estado da Bahia.
2 comentários:
que país é este onde se destroem vidas e carreiras sem dar maiores satisfações.....simplesmente acabam com a vida e a carreira de pessoas que nem se defender conseguem....País do Faz de conta....onde não existem leis e se existem nunca são cumpridas....pena Brasil voltamos à época da Inquisição....
Rogerio reveja seus conceitos sobre idade das trevas
Há superação total desta leitura pelos medievalistas
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