terça-feira, 25 de setembro de 2007

Recurso sem Efeito Suspensivo e Execução Provisória

A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que condenado à pena de 5 anos de reclusão em regime semi-aberto sustentava a impossibilidade da execução, antes do trânsito em julgado, do decreto condenatório expedido em seu desfavor, pois ainda pendente recurso especial. Considerou-se que, não possuindo os recursos especial e extraordinário efeito suspensivo do julgamento, inexistiria razão para se alegar ofensa ao princípio da inocência com o início da execução da pena. Vencido o Min. Marco Aurélio, relator, que deferia o writ para afastar a execução da pena enquanto pendente recurso quer de natureza ordinária, quer de extraordinária.HC 90645/PE, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ o acórdão Min. Menezes Direito, 11.9.2007. (HC-90645)
COMENTÁRIO
O STF insiste nesse posicionamento absurdo de que a ausência de efeito suspensivo nos recursos extraordinários “latu sensu”( Extraordinário e Especial) permite a início do cumprimento de pena.
Trata-se de uma total subversão do princípio da presunção de inocência, e de uma total submissão do Processo Penal a institutos do Processo Civil. Vejamos o absurdo da situação proclamada :
João, é condenado pelo TJ à uma pena de 04 anos e 06 seis meses de reclusão, em regime inicialmente semi-aberto, tempestivamente interpõe recurso especial alegando, p.ex., violação do art. 107 do Código Penal diante da existência de prescrição da pretensão punitiva.
Na mesma data Coisa Cola Brasil S/A, grande empresa do ramo de bebidas é condenada ao pagamento de R$ 50.000,00 a João ( o mesmo de cima) por Ter permitido que uma de suas garrafas circulasse com um inseto morto( barata) que foi consumido por João que teve infecção estomacal e quase morreu. A empresa interpõe Recurso Especial alegando que houve prescrição pois o autor deixou passar o prazo previsto no art. 203, § 3o, V do Código Civil.
Pela Lei 8.038/90 ( art. 27, § 2o) ambos os Recursos não possuem efeito suspensivo.
Pois bem, então, a princípio ambos podem ser executados provisoriamente, sem qualquer problema certo?
Errado, pois João para executar a empresa Coisa Cola S/A, terá de prestar CAUÇÃO no valor da condenação, conforme determina do art. 475-O, III do CPC, lembrando que tal caução deve ser “suficiente e idônea”.
E por que da caução para a execução? Pois nos termos do art. 475-O a execução provisória corre por conta e risco do exequente, que deve ressarcir todos os danos em caso de reforma da sentença.
Mas, pelo entendimento da Turma, o Estado pode executor provisoriamente a pena privativa de liberdade sem qualquer caução.
Então o que faz o STF, pega a regra da execução provisória , de natureza civil, ou seja, onde se lida com direitos disponíveis, e o transfere ao processo penal, só que de forma piorada, pois para a “execução provisória” o estado não presta qualquer contra-cautela.
Aliás, poderia-se exigir a contra-cautela da presença dos requisitos do art. 312 do CPP para tanto, mas não, basta a ausência de efeito suspensivo ao recurso para admitir-se o início do cumprimento de pena.
O que se esquece o STF é que a pena penal exige para o seu cumprimento o exaurimento do processo penal, exige que seja demonstrada a culpabilidade do agente em processo do qual não caiba mais qualquer recurso o que não é regra no processo civil, pois admite-se lá, a execução provisória.
Não há culpabilidade provisória, a Constituição não permite isso, e se a pena é a medida da culpabilidade, se não há culpabilidade provisória não pode haver pena provisória.
Como afirma GERALDO PRADO: “Ninguém poderá ser preso durante o processo por conta da pretensão de punição, se não se determinou, conforme as regras processuais, a responsabilidade penal do acusado. Não é possível antecipar a providência de direito material que somente uma sentença de mérito, no final do processo, pode prover.”( PRADO, Geraldo, Prisão e Liberdade , capturado em www.estacio.br)
Essa transposição direta do processo civil para o processo penal acaba por gerar danos ao princípio da presunção de inocência, pois iguala a condenação criminal a um mero processo de despejo por falta de pagamento. Como diz AURY LOPES, : “O equívoco consiste em buscar a aplicação literal da doutrina processual civil ao processo penal exatamente em um ponto em que não é possível tal analogia. Aqui é fundamental buscar-se categorias jurídicas próprias para explicar o fenômeno do processo penal.”.( LOPES JÚNIOR , Aury Celso, Fundamento, requisito e princípios gerais Das prisões cautelares , in REVISTA AJURIS, n.º 72, p. 221)
Concluindo para não cansar os amigos, ainda que o STF mostre-se em clara evolução para ser , de fato e de direito, a Corte que mais preserva as garantias fundamentais, ainda vemos alguns equívocos conceituais imperdoáveis.
Afinal, uma sentença penal, não é um despejo.
Abs

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